História e Jogos

A Primeira Guerra Mundial


O ESTOPIM

É em Sarajevo, atual capital da Bósnia-Herzegovina, que terroristas sérvios assassinam Franz Ferdinand e sua esposa Sophia em 28 de junho de 1914. Um mês depois, o Império Austro-Húngaro declararia guerra à Sérvia, dando início à Primeira Guerra Mundial!

Como a Primeira Guerra Mundial Começou?

Vocês perceberam que eu não coloquei como pergunta a expressão ‘Por que a Primeira Guerra começou?’ ou ‘Quais as causas da Primeira Guerra?’. Talvez eu não tenha essa resposta. Posso dizer que foi a corrida armamentista que causou o conflito, mas veremos mais tarde que não havia uma ‘corrida armamentista’ acontecendo, de fato. Também o ímpeto imperialista, mas o mercado financeiro ficou apavorado com a ideia de guerra; na verdade, não usarei isso apenas por não corroborar com o determinismo econômico, por agora. Apesar de Niall Ferguson, em seu livro O Horror da Guerra, praticamente ter mandado colocarmos no lixo o viés imperialista/capitalista como agente motivador do conflito, ele falha ao abordar apenas os grandes burgueses como imperialistas. Sabemos que são as nações e suas estruturas que impõem essa condição. Mas e o nacionalismo? Talvez tenha sido ele o verdadeiro responsável pelo início do conflito? Mas somente os sentimentos nacionalistas exacerbados não seriam o suficiente; tinha muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. Então, vamos só entender COMO tudo isso começou.

O Assassinato

Sarajevo – 28 de junho de 1914

Franz Ferdinand e sua esposa Sophia Chotek chegavam de trem a Sarajevo, embarcando em um automóvel conversível, modelo 1911 Gräf & Stift 28/32 PS. Da estação, eles partiriam para a prefeitura através da avenida Appel Quay, em um comboio de seis veículos. A escolha do dia para esse passeio não foi a melhor, pois nesta data era o dia de São Vito – uma data que representava para o povo sérvio a derrota para os otomanos em 1389 e a perda de Kosovo. Acontece que essa era a primeira vez que os sérvios poderiam comemorar a data, pois haviam reconquistado a região dos otomanos no ano anterior. Para os ultra-nacionalistas sérvios, a chegada de um herdeiro austro-húngaro a um território que os sérvios consideravam seu era uma grande afronta.

A organização ultra-nacionalista/terrorista sérvia conhecida como Mão Negra havia enviado sete terroristas para Sarajevo. O objetivo era assassinar o arquiduque Franz Ferdinand. Eles levavam consigo cinco bombas do tamanho de um sabonete com um detonador e fuso químico de 12 segundos. Junto com as bombas, carregavam revólveres e cianureto em pó – se alguém fosse pego, teria o suicídio como fuga. Dentre os sete integrantes, três eram amigos bósnios que estudaram em Sarajevo, se radicalizaram no ultra-nacionalismo sérvio e entraram para a organização. Eles eram Grabrez, Cabrinovic e Princip. O mais famoso seria Gravilo Princip, que com 19 anos, era magro, tuberculoso, mas obteve os melhores resultados de tiro em seu treinamento na Sérvia. (CLARK, 2014, Pág. 83)

O casal estava despreocupado com sua segurança, afinal de contas, já estavam hospedados em Ilidze há três dias e haviam visitado Sarajevo sem serem incomodados. Mal sabiam eles que Gravilo Princip os acompanhava à distância nesses dias. Ah, o dia do atentado também era o dia do aniversário de casamento de Franz e Sophia. Este já havia declarado seu amor por Sophia inúmeras vezes, assim como o amor por seus filhos.

Durante o trajeto pela cidade, na ponte Cumurija, um dos terroristas (Megmedbasic) desistiu de lançar a bomba, deixando os carros passarem. Em seguida, outro terrorista (Cabrinovic) lançou a bomba quando eles saíam da ponte, porém a bomba caiu atrás do veículo, explodindo no carro que vinha atrás, ferindo seus ocupantes e abrindo um buraco no carro. Não sabemos se a bomba bateu na capota aberta ou se Franz Ferdinand rebateu com as próprias mãos. Naquele momento, o arquiduque reagiu de maneira fria e racional, ordenando o cuidado aos feridos e o prosseguimento do comboio para a prefeitura. De lá, ele retornaria pela Appel Quay e visitaria os feridos no hospital. Cabrinovic abriu seu envelope de cianureto e se jogou no rio, porém, o cianureto só machucou seu estômago e o rio estava em um nível baixo. Ele foi encontrado metros depois numa bancada de areia.

O comboio prosseguia e passava por outros dois terroristas pelo caminho, sendo que ambos não tiveram coragem para fazer alguma coisa. Um deles, Popovic, atirou para o alto e escondeu a bomba próximo ao porão da associação cultural sérvia. Neste momento, Princip avistou seu amigo sendo carregado, agonizando devido ao veneno, e pensou em ir atirar nele para acabar com o sofrimento, porém o grande número de populares ao redor o impediu. Seu outro parceiro, Grabez, afirmou não ter conseguido tirar a bomba do seu bolso, pois havia muitas pessoas ao seu redor.

E assim Franz Ferdinand (Francisco Ferdinando) chegou à prefeitura. Nervoso, o prefeito fez um discurso de boas-vindas, mas foi repreendido pelo arquiduque, que logo se recompôs e agradeceu por ter sentido o carinho do povo local, apesar do atentado. Após os compromissos na prefeitura, o arquiduque começava a mostrar sinais de nervosismo e questionou sobre os perigos do caminho de volta. Ficou decidido que ambos seguiriam pela Appel Quay, ao invés da Franz Joseph, como era previsto. Sophie decidiu ir junto com Franz para visitar os feridos no hospital, e o conde Harrach ficaria em cima do estribo esquerdo do carro, como precaução a um possível atentado.

O comboio seguiu, porém esqueceram de avisar o motorista da mudança de itinerário. Quando ele entrou na Franz Joseph, o então general e governador da Bósnia, Potiorek, avisou o motorista: “Não é por esse caminho! Tínhamos que ir pela Appel Quay!” O carro começou a ser manobrado manualmente (ele não tinha marcha ré) e nesse meio tempo, Gravilo Princip (que esperava o comboio na Franz Joseph) percebeu a movimentação e foi diretamente em direção ao carro. Ao não conseguir desvencilhar sua bomba devido ao nervosismo, ele sacou seu revólver e disparou duas vezes à queima-roupa no casal – Harrach estava do lado esquerdo, no lado oposto, e nada pôde fazer. Na hora, ninguém entendeu que os tiros foram mortais, pois Franz e Sophie ficaram imóveis e eretos no banco traseiro. A verdade é que ambos estavam morrendo: a bala atravessou o abdome da duquesa, perfurando uma artéria gástrica, enquanto a segunda atingiu o pescoço de Franz Ferdinand, rompendo sua jugular. O carro partiu em retirada e durante o caminho Sophie desfaleceu. Nesse momento, Harrach escutou a famosa frase de Franz Ferdinand: “Sophie, Sophie, não morra, fique viva, pelos nossos filhos!” Logo depois ele perdeu a consciência. O casal foi levado ao palácio Konak, mas não havia mais nada a fazer. Aconteceu assim o estopim que levaria à Primeira Guerra Mundial.

Gavrilo Princip atira no Arquiduque Franz Ferdinand e em sua esposa. (Ilustração recriada por Achille Beltrame no jornal italiano La Domenica del Corriere em 12 de julho de 1914), porém, Franz Ferdinand estava sentado atrás à esquerda, e sua esposa, do lado direito.

As alianças

Muitos sabem que a Primeira Guerra Mundial desencadeou um jogo de alianças, que dispostas no mapa demonstram duas concentrações, chamadas de Tríplices. A Aliança composta por Áustria-Hungria, Alemanha e Itália e a Entente, composta por França, Rússia e Reino Unido. De antemão, já aviso que a Itália não respeitou o tratado e outras nações entraram em ambos os lados do conflito após as declarações de julho e agosto de 1914. Porém, convém esclarecermos como estavam as relações entre esses países antes da guerra começar.

Sérvia

Em 1903, um regicídio transformaria o país. Descontentes com a postura do rei Alexandar, que vinha desde o casamento com a rainha Draga até a sua postura de apaziguamento em relação à Áustria-Hungria, militares conspiradores invadiram o palácio real em Belgrado e assassinaram o rei e rainha quando os encontraram escondidos atrás da cortina, assim como outros ministros. Os corpos foram desfigurados, segundo o próprio barbeiro italiano do rei. O exército era muito importante para a ascensão social na Sérvia, já que a educação praticamente inexistia, havendo somente 4 escolas de pedagogia em todo o país. Num mundo sem oportunidades, o exército era a melhor opção. A partir de 1903, houve um crescimento de nacionalistas sérvios, que passaram a se concentrar na luta contra os turcos e búlgaros na Macedônia. A partir de 1908, também contra o Império Austro-Húngaro, que havia anexado formalmente um ex-território otomano, mas que anteriormente era Sérvio, a região da Bósnia Herzegóvina. Houve uma comoção tão grande entre os sérvios que o país quase foi “obrigado” a declarar guerra ao Império Austro-Húngaro, o que representaria uma derrota quase certa. A Bósnia era considerada o “coração” da Grande Sérvia, tanto geograficamente quanto etnicamente.

Desta grande indignação, uma organização nacionalista nasceu, a Odbrana (Defesa Nacional Sérvia), um grupo de guerrilheiros nacionalistas que iria recrutar voluntários, inclusive na Bósnia. Por um tempo, parecia que a Sérvia iria realmente fazer um ataque suicida à Áustria-Hungria para reverter a anexação da Bósnia. O governo da Sérvia até apoiou o grupo, porém no inverno de 1908-1909 as potências europeias intervieram e a Sérvia desistiu de qualquer ação, o grupo acabou se desmembrando. Do “ressentimento” dos nacionalistas nasceu um radicalismo ainda maior, o que fomentou o surgimento de outros grupos, como a União ou Morte, conhecida popularmente como Mão Negra. Os líderes do grupo eram os mesmos regicidas de 1903 e o grande objetivo do movimento era a unificação da Sérvia.

Território da Sérvia antes da Guerra dos Balcãs de 1912
Cidadãos de Sarajevo leem um cartaz com a proclamação da anexação austríaca em 1908

Áustria-Hungria

O Império Austro-Húngaro era um remanescente dos impérios do século XIX, ainda sob a família Habsburgo, que sobreviveu a uma série de derrotas militares importantes no século XIX, principalmente contra o jovem Reino da Itália em 1859 e contra a Prússia em 1866. Ambas as derrotas acabaram por destruir a capacidade militar do Império Austríaco, levando, em 1867, às duas nacionalidades dominantes (alemã e húngara) a compartilharem o poder através de dois parlamentos distintos. Delegações de 30 deputados de cada bancada se reuniam aleatoriamente em Viena e Budapeste, prestando contas ao imperador.

O descontentamento com este modelo era generalizado. Por um lado, os nacionalistas húngaros acusavam os germânicos (austríacos) de negarem a independência plena da Hungria ao negarem um exército próprio. Por outro lado, os germânicos-austríacos acusavam os húngaros de se beneficiarem da economia mais avançada da Áustria. Mas não eram apenas esses dois povos que coexistiam no Império. Havia onze nacionalidades oficiais na Áustria-Hungria, como os alemães, húngaros, tchecos, eslovacos, eslovenos, croatas, sérvios, romenos, rutenos, poloneses e italianos. Era um problema muito sério a ser combatido, pois em um contexto de nacionalismo extremado, como conter tantas nacionalidades sob uma esfera de poder que privilegiava primeiro os germânicos-austríacos e húngaros? O crescimento industrial e econômico era acompanhado por um investimento em política social, o que garantia um apaziguamento (frágil) das diversas nacionalidades, trazendo uma compensação – a da segurança coletiva através das políticas de bem-estar social como saneamento, imposição da lei e manutenção de uma complexa infraestrutura.

O Imperador era Franz Joseph (Francisco José). Ele manteve o controle da máquina do seu Império, equilibrando os diversos interesses que norteavam o seu governo e participando ativamente de todas as fases da reforma constitucional. Sua vida pessoal foi marcada por tragédias; sua esposa (Sissi) foi morta por um anarquista italiano, seu filho Rudolf se suicidou com a amante, e seu irmão Maximiliano se tornou imperador do México, sendo morto numa conspiração. Até sua sobrinha favorita acabou morrendo queimada ao acender um cigarro e o mesmo ter incendiado suas roupas. Por isso, o herdeiro do trono era o filho de outro irmão seu, chamado Franz Ferdinand, o Francisco Ferdinando. No ano de início da Guerra (1914), ele já tinha 83 anos, uma idade mais avançada do que quase a totalidade dos seus súditos; para muitos, ele era apenas uma personificação do passado, sem lugar no presente.

As derrotas militares do século XIX forçaram o Império Austro-Húngaro a expandir seus interesses no mar Adriático (assim como a Itália) e na região dos Balcãs. A Bósnia-Herzegóvina já pertencia a seus domínios há trinta anos, porém, não havia nenhuma ação de anexação formalizada; isso ocorre em 1908, num período em que a Rússia (impedida de agir na Pérsia e no Tibete) também só tinha olhos para aquela região, marcada por uma população eslava, na qual os russos se consideravam os mantenedores, por também serem eslavos. A anexação da Bósnia-Herzegóvina atraiu a ira dos sérvios e o descontentamento dos russos.

A Tríplice Entente e a Tríplice Aliança

Os Impérios da Europa evitaram diversos conflitos entre si após a queda de Napoleão, mesmo sob um contexto de grande disputa econômica (imperialismo) e disputas hegemônicas (nacionalismo) sobre outras regiões, a partir de estratégias diplomáticas como as Alianças (alianças formais entre nações, que continham ajuda política e militar entre elas), as Ententes (acordos informais, mais maleáveis, mas que continham também deveres políticos e militares) e as Détentes (políticas diplomáticas de apaziguamento para evitarem conflitos). Neste contexto, podemos destacar a Tríplice Aliança entre Alemanha, Itália e Áustria-Hungria, assinada em maio de 1882, e a Tríplice Entente, um forte bloco político e militar consolidado em 1907.

Basicamente, a necessidade de evitar um conflito entre Itália e Áustria-Hungria motivava a Alemanha a integrar uma aliança com estas duas nações, esta era “renovada” a cada dez anos. Apesar disso, a Itália sempre manteve uma relação ambígua com esta aliança, assinando diversos “acordos secretos” com outras nações, como com a própria França. Além disso, a relação da Itália com a Áustria-Hungria piorou a partir da anexação da Bósnia-Herzegóvina, pois o Império Austro-Húngaro tinha ignorado algumas condições, como escolas de língua italiana em algumas regiões do império onde havia maioria italiana. Do outro lado, os austro-húngaros não gostavam do apoio da Itália a Montenegro, pois este pequeno enclave tinha uma verdadeira montanha de canhões apontando para o Adriático, o que dificultaria qualquer ação da marinha austro-húngara na região. Para a Alemanha, mais poderosa economicamente e militarmente do que estas nações, a Aliança era o único tratado defensivo que restava.

Quanto às motivações para a formação da Entente, “naturalmente” a França e a Rússia criaram uma relação de aproximação, principalmente devido ao interesse comum em enxergar a Alemanha como um adversário poderoso quanto às suas ambições. Enquanto a Rússia se preocupava com a aproximação dos alemães aos turco-otomanos e à Áustria-Hungria, o que interferiria nos seus interesses sobre a região dos Balcãs, a França tinha divergências territoriais com a Alemanha (como Alsácia-Lorena) desde a derrota na Guerra Franco-Prussiana (1870) e havia um conflito iminente devido à interferência da França em territórios do norte da África. Quanto à decisão do Império Britânico, ela foi motivada por enxergar nesses países (França e Rússia) inimigos potenciais, pois somando a marinha desta entente, elas estavam se aproximando da própria marinha inglesa, a mais poderosa do planeta. A Alemanha só deixou de ser vista como um aliado poderoso (e quase houve uma entente anglo-germânica) quando os ingleses perceberam que ela não representava mais uma ameaça.

A Guerra dos Balcãs

Mapa da região dos Balcãs antes do conflito. (mapa do ano de 1911)

Em 1911, a França domina o Marrocos (que era da Espanha) e a Alemanha intervém, quase iniciando um conflito que acabou sendo intermediado e consolidou o espaço da França naquela porção norte da África. A Itália passou a observar a Líbia, dominada pelos Otomanos, como uma região necessária para consolidar sua política imperialista e, com aval da Tríplice Entente (Áustria-Hungria e Alemanha foram contrárias), os italianos invadem a Líbia no outono de 1911. Nesta guerra, tivemos inovações como a observação aérea (através de aviões e dirigíveis) e os bombardeios aéreos. A introdução dos holofotes impediu muitas incursões noturnas dos líbios, diminuindo as chances de resistência àquela diferença tecnológica. Os italianos empregaram 100 mil homens, conquistando Trípoli e Bengasi rapidamente, porém, passaram a ter dificuldades para entrar no território líbio e, para compensar, iniciaram uma guerra marítima contra o Império Otomano, forçando um acordo de paz em outubro de 1912.

Desde o outono de 1911, países dos Balcãs já criavam acordos para uma ofensiva geral contra os Otomanos na região. Desta maneira, em novembro de 1912, uma Liga Balcânica (composta por Bulgária, Sérvia, Montenegro e Grécia) iniciava um conflito contra as regiões dominadas pelo Império Otomano.

A Primeira Guerra dos Balcãs

Talvez poucos esperassem uma vitória tão rápida e avassaladora sobre os otomanos, mas ela de fato ocorreu. A Bulgária avançou pela região da Trácia, com um exército de 300 mil homens (15% da população masculina do país). Os búlgaros enfrentaram os turcos conseguindo uma vitória tão rápida e expressiva sobre a fortaleza Edirne (Adrianópolis) que o avanço rumo a Constantinopla foi marcado por uma estratégia improvisada, com pouco conhecimento geográfico. A poucos quilômetros da capital Constantinopla, os búlgaros acabaram sendo freados pela artilharia otomana.

Dirigíveis italianos bombardeiam posições turcas em território líbio. A Guerra Ítalo-Turca foi a primeira na história a apresentar bombardeios aéreos por aviões e dirigíveis.

Já os sérvios entraram no norte da Macedônia com um exército de 132 mil homens, conseguindo vitórias expressivas, avançando até as margens do rio Dragor (Macedônia) em apenas três semanas. A grande vitória sobre os otomanos nos montes Oblakov consolidaria a expulsão dos otomanos da Macedônia. Depois desta ofensiva, os sérvios foram ajudar os montenegrinos no cerco à cidade fortificada de Scutari na Albânia.

Os gregos concentraram suas atenções somente na tomada de Salônica, maior cidade da Macedônia. Esta cidade era um porto estratégico da região e motivo de atenção dos búlgaros, que buscavam o domínio deste porto. Por isso, quando os gregos começaram a cercar a cidade, os búlgaros abandonaram posições na Macedônia para os sérvios, para evitar o domínio grego da cidade portuária. Ao negociar com o general otomano, os búlgaros ouviram dele que “ele não tinha como ceder duas vezes a mesma cidade”. Os gregos dominaram Salônica, porém, os búlgaros conseguiram manter 15 mil homens na cidade, como forma de poder negociar posteriormente. Os otomanos assinariam um armistício em 3 de dezembro de 1912.

A Segunda Guerra dos Balcãs

Búlgaros e sérvios haviam tratado da divisão territorial da Macedônia antes mesmo do fim da Primeira Guerra dos Balcãs. Porém, a morte do primeiro-ministro sérvio fortaleceu a ideia de que os sérvios deveriam exigir mais espaço territorial além de Kosovo, ou seja, territórios que englobavam grande parte da Macedônia e que os próprios sérvios haviam conquistado. Os búlgaros queriam negociar sob a intermediação do tsar (eles acreditavam que a Rússia ficaria ao seu lado), porém, a resposta russa foi em favor da manutenção dos territórios conquistados pela Sérvia. Em julho de 1913, os búlgaros atacaram as posições sérvias sem declaração de guerra. Os turcos, gregos e romenos aproveitaram-se para se aliarem aos sérvios e começaram a atacar os flancos búlgaros. Enquanto os sérvios e búlgaros se entrincheiravam no leste e os gregos empacavam após a batalha na desfiladeira Kresna, os romenos avançavam para Sófia, capital da Bulgária, forçando um armistício da mesma. A Bulgária perdeu grande parte dos seus territórios conquistados na Primeira Guerra dos Balcãs e teve seu exército destroçado.

A Guerra dos Balcãs exigiu uma grande détente entre russos e alemães, mostrou à Áustria-Hungria sua irrelevância na região e fortaleceu alianças, pois garantiu a preferência russa pelos sérvios, abrindo espaço para a influência alemã na Bulgária, a partir de imensos empréstimos. Da mesma forma, o Império Otomano também passava a ter grande influência do Império Alemão.

A Crise de Julho de 1914

A notícia do assassinato de Franz Ferdinand (Francisco Ferdinando) e sua esposa Sophie (Sofia) foi rapidamente coberta pela imprensa. No dia seguinte, já tínhamos relatos sobre os atentados, a vontade de Franz Ferdinand de retornar ao hospital e ver os feridos, e sua relação de amor com seus filhos. Tudo isso retirou qualquer possibilidade de criar uma antipatia política por ele no Império Austro-Húngaro, criando uma imensa comoção sobre o evento, que no momento já era considerado histórico. Para grande parte dos leitores, o evento não foi pessoal, mas sim político. Durante o velório do casal, o Imperador Franz Joseph (Francisco José) indagava a Conrad sobre a resposta alemã sobre um eventual apoio. A Áustria-Hungria buscava a guerra contra a Sérvia.

Apenas Mehemedbasic conseguiu escapar, então a investigação pelos assassinatos começou logo após o atentado. Princip e Cabrinovic, entre outros, conseguiram confundir os investigadores através de depoimentos que não se conectavam. Por isso, mesmo as armas sendo sérvias, houve uma dificuldade em acusar diretamente o governo sérvio pelo atentado. Mesmo assim, o Império Austro-Húngaro acusava abertamente o reino vizinho. Pressionados, os sérvios pediram ajuda para a Rússia, pois seu exército estava debilitado devido às guerras nos Balcãs e o reino havia crescido e precisava manter a integridade dos novos territórios. Em resumo, a Sérvia era um Estado fragilizado pelo atraso militar (tanto em homens quanto em tecnologia) e também era economicamente e estruturalmente debilitado, então seu grande aliado russo teria que agir.

Cena do julgamento dos participantes do atentado de Sarajevo. Princip, Čabrinović, Grabež, amigos que participaram da ação, foram condenados a 20 anos de prisão, pena máxima para menores de 20 anos. Princip vai morrer de tuberculose na prisão em 1918.

Resumidamente, a Rússia se viu obrigada (como sempre prometera) a manter a certeza de um apoio irrestrito à Sérvia, devido à proximidade étnica (ambos eram eslavos) e ao seu interesse na região dos Balcãs. Durante todo o mês de julho, houve intensa diplomacia entre os membros de ambas as tríplices. Do lado da Aliança, basicamente a Áustria-Hungria se convencia (e era convencida) a entrar numa guerra contra a Sérvia, só necessitando, neste caso, da certeza do apoio alemão. Já a Rússia ganhava garantias da França, inclusive com a visita do presidente francês Poincaré à Rússia do Tsar Nicolau II, de que a França entraria em guerra contra a Alemanha em caso de apoio alemão à Áustria-Hungria. Para a França, era importante manter a Rússia como aliada com potencial militar contra a Alemanha, já que o poder militar alemão crescia e a França tinha muitos investimentos na Rússia, principalmente em relação às estradas de ferro. O apoio popular à entrada da França na guerra era garantido devido ao grande ressentimento francês (revanchismo) com relação à sua derrota para a Prússia em 1870 e à criação do Império Alemão dentro do seu palácio de Versalhes em 1871.

Os alemães tinham interesse no conflito imediato, pois mesmo sem apresentar o grande crescimento militar que muitos apontam (os números demonstram que nunca houve uma corrida armamentista e sim um crescimento no gasto militar nos últimos anos), a Alemanha se via numa condição mais avançada do que a Rússia e a França. Se houvesse um conflito mais tardio, ambos os países teriam recuperado sua vantagem, enquanto a Áustria-Hungria (único parceiro de confiança) estaria mais fragilizada. Além disso, o Reino Unido da Grã-Bretanha não tinha uma grande força terrestre na Europa. Desta maneira, o Kaiser Guilherme II deu um “cheque em branco” para a Áustria-Hungria, mais do que autorizando, praticamente impondo que a mesma declarasse guerra aos sérvios.

Dentro do governo inglês, havia uma preocupação com o alastramento do conflito. Desta maneira, os britânicos pediam alguma negociação entre ambos os países e tentavam manter o conflito exclusivamente entre o Império Austro-Húngaro e a Sérvia. Os ingleses sabiam da proximidade dos franceses e russos, não apenas nos seus acordos políticos, mas também em seus interesses econômicos e compromissos militares. Apesar de mostrar apoio aos franceses e declarar que se a França entrasse na guerra seria inevitável para os ingleses seguirem o mesmo caminho, internamente na Grã-Bretanha houve um extenso debate sobre a participação numa eventual guerra europeia. Esse debate só foi facilitado quando os alemães deram um ultimato à Bélgica.

Dessa forma, a Áustria-Hungria enviou um ultimato à Sérvia em 23 de julho de 1914, contendo um conjunto de medidas que os sérvios teriam que tomar com relação ao assassinato, tornando qualquer negociação impraticável. Como o ultimato não foi atendido em todos os seus pontos, em 28 de julho de 1914, a Áustria-Hungria declarou guerra à Sérvia, e a guerra começou.

Referências Bibliográficas

  1. Ferguson, Niall. O Horror da Guerra: uma provocativa análise da primeira guerra mundial. Editora: Planeta, 2014.

  2. Sondhaus, Lawrence. A Primeira Guerra Mundial. Editora: Contexto, 2014.

  3. Clark, Christopher. Sonâmbulos: Como eclodiu a Primeira Guerra Mundial. Editora: Record, 2018.