E aqui vem o último movimento: o de Lênin. Apesar de ter mudado de ideia algumas vezes, Lênin voltou a escrever e clamou aos bolcheviques que a hora era de uma insurreição revolucionária — e ela deveria ser liderada pelo Partido Bolchevique. A decisão sobre o que fazer ficaria para outubro.
Outubro: o mês em que a História ganharia um novo capítulo de rompimento — algo impensável para nós, pobres alienados do século XXI. Basicamente, os alemães forçaram os exércitos russos de tal forma que o governo de Keriénski começou a cogitar mudar a capital de Petrogrado para Moscou. Isso enfureceu os socialistas, e é nesse contexto que Lênin “força a barra” para sua ideia de insurreição. Ele envia cartas a diversos comitês falando sobre a necessidade urgente de uma tomada do poder pelos bolcheviques. Aquele lema de “Todo poder aos sovietes” já dava lugar à tomada de poder pela elite dirigente, para garantir outra demanda do povo: “Pão, Paz e Terra!”. E, só para constar, Lênin passa a ter um aliado forte nesse processo de convencimento: Trótski, que agora, como bolchevique, liderava o soviete da capital — aquele que ele mesmo ajudara a fundar.
Com as discussões se aprofundando nos comitês e sovietes, Keriénski, ainda no poder, descobre os planos e tenta articular a defesa do regime, seja tentando relocar tropas do front para a capital, seja se organizando politicamente. Enquanto isso, Lênin e Trótski prometiam não tomar ação alguma sem a realização de um congresso e o aval de todos. Porém, em 24 de outubro de 1917, o Estado-Maior do Exército manda levantar as pontes da cidade de Petrogrado, assim como em julho — o que enfurece a população. Foi um corre-corre para dominar as cabeças de ponte; até as mulheres do Batalhão da Morte correram para proteger as pontes do Palácio de Inverno, mas, durante a noite, as massas já controlavam a maioria delas.
Enquanto isso, na política, também havia uma corrida nos bastidores. Lênin chegava na madrugada do dia 25, vindo da Finlândia; no parlamento, mencheviques e socialistas revolucionários articulavam uma coalizão exclusivamente socialista. Já Keriénski se via cada vez mais encurralado, ainda mais com a chegada de navios da marinha repletos de revolucionários. Às 11 da manhã do dia 25 de outubro, ele fugiu em busca de reforços.
Lênin queria a tomada do poder antes da abertura do Congresso dos Sovietes, para poder anunciar que a insurreição havia obtido êxito — em grande parte, graças ao apoio do Comitê Revolucionário Militar, que comandava as ações em Petrogrado. Duas ações marcariam o longo 25 de outubro de 1917: a disputa pelo Palácio de Inverno, onde as tropas dos Kadets ainda estavam entrincheiradas, e o II Congresso dos Sovietes, onde Trótski, Lênin e Martov debatiam suas posições. Alguns mencheviques e socialistas revolucionários — incluindo Martov — saíram contrariados com a decisão de tomada de poder feita por Lênin.
Assim, às 5 horas da madrugada de 26 de outubro de 1917, o manifesto de Lênin foi aprovado por ampla maioria dos presentes no Congresso. O governo revolucionário havia sido proclamado.
Golpe ou revolução? Calmaaaa, tem um intruso aqui! “E assim, nasceu a ‘Revolução’ Russa: um golpe de Estado orquestrado por uma minoria elitista que se aproveitou das circunstâncias para tomar o poder. Mas não tema!” (Braga, 2025). O pseudo-historiador faz a gente se sentir inteligente — talvez esse seja o segredo do seu sucesso. Na verdade, podemos considerar golpe a ação de Lênin no II Congresso dos Sovietes, pois, ao agir pela insurreição, ele impediu qualquer tentativa de formulação de um governo provisório a partir de uma coesão socialista. Porém, foi principalmente uma revolução: o mesmo II Congresso aprovou as demandas do povo, como “Paz e Terra” e outras ações, como o controle operário e o direito à secessão. Nunca na história houve tanta concessão às maiorias. E aqui fica uma coisa bem clara: o Congresso não apoiou mudanças feitas de cima para baixo, como funciona no governo liberal que o Tiaguinho tanto ama — essas mudanças foram feitas de baixo para cima. E você, quer algo mais revolucionário do que isso?