História
Criado pela Games Workshop em 1987, Warhammer 40.000 é um jogo de tabuleiro de miniaturas ambientado em um universo distópico de ficção científica, inspirado por obras como Duna e 1984. O universo de Warhammer 40.000 se passa no 41º milênio, onde a humanidade vive sob o domínio do Imperium, um império galáctico totalitário e teocrático. O Imperador da Humanidade, após unificar a Terra e conquistar milhões de mundos, foi mortalmente ferido durante a Heresia de Horus, uma guerra civil provocada pela traição de seu comandante mais confiável. Agora, ele permanece em um trono de vida artificial, sustentado por sacrifícios diários, enquanto sua consciência guia a humanidade através do Astronomican, um farol psíquico essencial para a navegação no espaço.
O Império enfrenta ameaças constantes de diversas facções, incluindo os Orks, uma raça de guerreiros brutais; os Eldar, uma civilização antiga e decadente; os Necrons, mortos-vivos metálicos; os Tyranids, uma espécie insectóide devoradora de planetas; os Tau, uma raça jovem com ideais expansionistas; e os Deuses do Caos, entidades malignas que corrompem e distorcem tudo o que tocam. Em meio a esse cenário sombrio, os Space Marines (Adeptus Astartes) surgem como super-soldados geneticamente modificados, dedicados a proteger a humanidade a qualquer custo. A guerra é constante, e a sobrevivência da humanidade depende de sua fé inabalável no Imperador e na força de seus exércitos (Games Workshop, 1987).
A franquia, que se expandiu para romances e jogos digitais, como as versões Dawn of War e Space Marine, construiu uma comunidade global que retrata o Imperium da Humanidade como um regime teocrático que domina galáxias por meio de conquistas, vigilância e culto ao Imperador, enfrentando alienígenas (Eldar, Orks, Tyranids) e forças caóticas. O jogo de tabuleiro, cuja décima edição foi lançada em 2023, envolve batalhas táticas nas quais jogadores constroem exércitos com miniaturas personalizadas, utilizando dados e regras detalhadas para simular combates em cenários galácticos. Cada jogador escolhe uma facção entre os Space Marines do Imperium ou os Orks e, após isso, planeja estratégias baseadas em pontos de exército, movimentação e habilidades específicas descritas nas regras do jogo.
A narrativa de Warhammer 40.000, centrada na Grande Cruzada e no controle imperial, reflete dinâmicas de colonialismo e imperialismo, como a exploração de recursos em mundos-forja — planetas industriais controlados por facções dedicadas à tecnologia e à produção — e a imposição cultural da Eclesiarquia, servindo como metáfora para práticas históricas de dominação.
O colonialismo — do latim “lugar para a agricultura” — reflete muito da tortura, do massacre e da pilhagem que ele foi e ainda é. Pode ser conceituado como um método de dominação de uma nação sobre outra por meios territoriais, culturais e econômicos. Esse termo era utilizado para designar comunidades agrícolas fora das “minhas terras”, mas já se percebe a enorme destruição ideológica que seu contexto traz: chegar, aniquilar e chamar de “comunidade agrícola” é um soco na cara de qualquer pessoa que aprecia a história ou que passou por tal tragédia. Essas comunidades tinham suas religiões, seus modos de pensar e sua cultura, mas infelizmente foram transformadas em espaços de exploração.
O colonialismo buscava a extração de recursos e matérias-primas de suas “comunidades agrícolas” para o desenvolvimento das metrópoles, o que pode ser considerado, de forma irônica, “a melhor coisa a se fazer para os povos da comunidade agrícola”. Além disso, existiam dois modelos de formação de colônias: o de exploração, que buscava a extração de riquezas, e o de povoamento, ligado ao deslocamento de colonos para o território a ser dominado. Em ambos os casos, comunidades sem fonte de desenvolvimento e sem aspectos ideológicos eram reduzidas a uma condição equivalente à de um “zumbi ambulante”.
Nos aspectos religiosos, nota-se que os povos europeus vinham e tentavam impor sua fé (cristianismo — igreja greco-romana), praticando uma xenofobia que transformou não só a “comunidade agrícola”, mas todo o modo de vida desses povos, obrigados a trocar suas crenças e formas de pensar para se adequar a um modelo considerado “ideal e adequado”. Esse processo está diretamente ligado ao imperialismo e ao orientalismo — conjunto de estereótipos sobre o “Oriente” que serve para justificar o domínio e a exploração do Ocidente sobre essas regiões, especialmente durante a expansão colonial —, este último construído como uma falsa ideia de globalização que legitima a invasão e a opressão do Ocidente sobre o Oriente.
Um exemplo atual de colonialismo são os povos indígenas da Amazônia. O avanço de mineradoras, madeireiras e do agronegócio sobre terras indígenas no Brasil pode ser considerado um colonialismo interno, pois grupos mais fortes exploram os recursos naturais dos territórios de grupos mais fracos, destruindo a cultura dos povos originários.
O imperialismo surgiu em um contexto de transformações impulsionadas pela Segunda Revolução Industrial, que aumentou a produção e a competição, mas reduziu as taxas de lucro, trazendo barreiras comerciais, como tarifas de importação e cotas. Nesse contexto, o Estado-nação buscava expandir seus territórios e mercados para garantir recursos e restringir a concorrência.
A democracia liberal, no imperialismo, por meio de propagandas e discursos como progresso, civilização e liberdade, servia para justificar a expansão territorial e econômica, mascarando a dominação e a exploração dos povos colonizados. Dessa maneira, em 1914, aproximadamente 80% do planeta já estava sob o controle de potências europeias, dos Estados Unidos e do Japão. Nesse momento da história, o mundo era fortemente influenciado pelo mercantilismo, que buscava criar fontes de matérias-primas e mercados consumidores para as metrópoles.
Em uma segunda análise, observa-se que colonialismo e imperialismo são práticas indissociáveis, pois ambos servem à expansão de um reino ou império. No entanto, o colonialismo é uma prática muito antiga, já utilizada por gregos, romanos, entre outros povos.
Imperialismo direto – cooptação e repressão:
Durante a conquista das Américas, os impérios europeus, combinados com a cooptação das elites locais, obtiveram vantagens sobre os povos nativos, explorando ressentimentos internos e se beneficiando da disseminação de doenças. No final do século XIX, o avanço tecnológico elevou o poder bélico, permitindo a vitória sobre nações menos equipadas. O recrutamento de elites locais para a administração fazia parte da estratégia de controle territorial e militar, baseada na ideia de inferioridade dos povos dominados, o que exigia repressão constante.
Imperialismo direto – colônias de povoamento:
Caracteriza-se pela eliminação total ou parcial das populações nativas para a substituição por colonos, especialmente em territórios semelhantes às metrópoles. Esse modelo foi utilizado em regiões como Canadá, Austrália e África do Sul, onde populações brancas se tornaram predominantes.
Imperialismo indireto – comércio, serviços financeiros e cultura:
Operou por meio de laços comerciais, financeiros e culturais. Um exemplo é a pressão exercida por potências europeias, como a Grã-Bretanha, que estacionavam frotas navais próximas às capitais de países devedores para garantir o pagamento de dívidas ou tratados comerciais vantajosos. Esse método permitia a manutenção da independência formal, mas com forte subordinação econômica.
Em uma primeira comparação, percebe-se que imperialismo e colonialismo são práticas semelhantes e conectadas. No imperialismo, as nações permanecem formalmente autônomas, embora estejam sob dominação e manipulação externas. Já no colonialismo, as nações deixam de existir como independentes e passam a ser controladas diretamente, tornando-se submissas.
Historicamente, diversos impérios praticaram a colonização de outros povos, como os romanos. Atualmente, observam-se fenômenos semelhantes, como o caso de Israel e Gaza. Israel declarou como objetivo neutralizar o Hamas e consolidar seu controle sobre a região, enquanto os palestinos habitam essas terras há muito mais tempo. Mesmo com toda a tecnologia disponível, ainda é difícil aceitar que narrativas históricas ou religiosas justifiquem a expulsão completa de um povo de seu território.
Em Warhammer 40.000, ocorre o colonialismo do Império da Humanidade em diversos planetas e civilizações, colonizados para obtenção de recursos, transformando-se em terras imperiais e submetendo raças inteiras ao domínio do Imperium. Um exemplo claro aparece no início da Grande Cruzada, quando o Imperador da Humanidade ordena a conquista da Lua, simbolizando o início da expansão imperial em escala galáctica.
Em uma segunda análise, observa-se um modelo de imperialismo semelhante ao da China na África atualmente, baseado na busca por recursos estratégicos e no endividamento diplomático. Em Warhammer 40.000, práticas semelhantes ocorrem de forma direta, resultando no controle total do Imperium sobre outras civilizações. A Heresia de Horus evidencia como disputas internas por poder podem gerar conflitos devastadores, refletindo práticas de imperialismo e hegemonia observáveis também no mundo real.
Com esta análise, percebe-se que o universo de Warhammer 40.000, mesmo sendo fictício, apresenta diversos elementos ligados ao colonialismo e ao imperialismo. O Imperium domina povos e planetas de forma semelhante aos impérios do mundo real, impondo cultura, religião e poder. Ao comparar o jogo com fatos históricos e situações atuais, torna-se evidente que a obra não é apenas entretenimento, mas também um reflexo crítico de como a busca por controle e exploração ainda faz parte da realidade contemporânea.
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